Na boca do caixa

Extrato diário da vida de um bancário, direto da Faixa de Gaza.

31.10.06

Roleta Russa bancária

Segundo a Wikipedia, roleta russa "É uma operação que consiste em deixar uma só bala no tambor de um revólver, fazê-lo girar, apontar o cano da arma para si próprio ou para outrem, sem conhecer a posição exata da bala, e apertar o gatilho, isso por bravata e/ou desejo de experimentar emoções violentas."
Estas palavras não definem exatamente o que se passou aqui nas últimas 48 horas.
Ontem foram três assaltos, dois deles aqui na nossa região, com um vigilante morto no terceiro. Hoje assaltaram uma lotérica aqui pertinho, com um brigadiano morto e um dos assaltantes com inacreditáveis 15 tiros hospitalizado. Além disto, outra agência bancária foi assaltada e a perseguição resultou num tiroteio... no início da Faixa de Gaza, claro, com dois assaltantes com passaporte para o além carimbados no hospital.
Numa época de folha de pagamento, o tambor gira e a gente nunca sabe quando chega a nossa vez... amanhã? Click! Não sei.

19.10.06

Um pouco de sol para os prisioneiros

Numa daquelas raras e felizes oportunidades que temos em um mês, hoje consegui sair do banco com o sol alto. Sim, senhores! Cheguei em casa com o astro rei se exibindo por um bom tempo. Pena que os caixas de banco só conseguem desfrutar plenamente do término da jornada com sol durante o horário de verão ou em baixa temporada de movimento.
Lembrei-me de uma tira de quadrinhos do Frank & Ernest, no qual os personagens saíam do trabalho no final do expediente e um perguntou ao outro:
- Sabia que eu acredito em reencarnação?
- Porque você acredita nisto?
- É que todos os dias, às seis da tarde, eu sinto que voltei a viver...

17.10.06

O céu de cada um

Quando se atende pessoas em grande quantidade, o desgaste geralmente é grande. Cada pessoa ali na sua frente é um universo de sentimentos próprios que nem sempre compreendemos. Muitas vezes a criatura já chega na sua frente tendo passado por situações-limite e você, não sabendo disso, acaba não entendendo suas reações.
Ontem um senhor com mais de setenta anos chegou no caixa ao lado e estava um tanto confuso, com dificuldade de lembrar senhas e tudo o mais. Seria uma situação irritante dentro de uma rotina de atendimento diário mas, minha colega começou a conversar com o cliente e ele explicou que estava há 48 horas sem dormir depois de sepultar sua única irmã.
Hoje foi comigo. Um cliente que trabalha com banca de revistas e sempre chegava sorridente, brincando com todo mundo, estava diferente. Depois de encaminhar seu depósito e trocarmos umas duas ou três palavras, notei que aquele jovem de quase dois metros de altura fazia força para conter as lágrimas que, em pouco tempo, jorravam-lhe em profusão. Perguntei a ele o que se passava mas ele se limitou a dizer que eram problemas familiares. Soube depois que problemas financeiros, com fornecedores inclusive, tornaram-lhe o céu cinzento.