Na boca do caixa

Extrato diário da vida de um bancário, direto da Faixa de Gaza.

23.7.06

O torresmo possível

Cara, a crise tá braba. Sabe o que é os bodegueiros da região virem pagar uma pilha de títulos de fornecedores protestados em cartório? Ou o cara pegar a maior fila no caixa para sacar menos de cinco reais?
A vida está dura, mas o sinal mais evidente é a quantidade de pessoas que estão assaltando até o Buda da estante para fazer depósitos e pagamentos com grandes volumes de moedas. No último dia 10, movimento grande na agência, uma professora chegou ao meu caixa e, quando vi ela erguendo uma sacola de supermercado com os dois bracinhos e largando no meu guichê, quase caí para trás. A sacola estava até a metade com moedas de todos os valores, muito bem misturadas...
- Moço, eu quero fazer um depósito.
- A senhora poderia ao menos separá-las por valor para facilitar a contagem?
- É que sou professora, estou no meu horário de almoço e dou aulas no município vizinho. Vocês não têm aquelas máquinas que contam moedas?
- Temos sim (mostrei meus dedinhos para ela). Olha, eu terei que fazer este depósito amanhã, hoje será impossível porque não posso parar de atender a fila para contar estas moedas todas. A senhora não pode passar outro dia para pegar o comprovante? A propósito, quanto tem aqui nesta sacola?
- Ah, nem tenho idéia, acho que tem uns duzentos reais (que maravilha isto, na realidade tinha quase trezentos reais).
Na sexta foi a várzea: além do cidadão fazer o seu depósito em moedas, ele ainda acondicionou elas em várias trouxinhas de jornal velho. Que dureza. O povo na Faixa de Gaza está fritando merda para comer torresmo...